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Channel: um velho mundo
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Fruto do mundo

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O presente texto atropelou diversas ideias que eu tinha para esta página (com novo layout mais uma vez, inclusive - o que não muda são os porcos) por uma questão totalmente errática do cosmos e uma atitude embaraçosa de minha pessoa, mas isso não vem ao caso. O começo de tudo que escolho dizer a vocês é o seguinte: estava eu no jardim do museu no meio da tarde, bem abaixo de uma árvore de pelo menos dez metros de altura e que é casa de diversas aves, sobretudo maritacas. No instante em que resolvi prestar atenção onde estava sentada veio uma rajada de vento gostosa, daquelas que traz junto um arrepio no coração, e impulsiona nossa mente.

Dez metros é pouco para essa princesa

Pois bem, me vieram questões e comparações à mente, coisas que tenho vez em quando, em momentos aleatórios. Não digo que este seja um texto científico, porque não o é - inclusive nenhum neste blog é, porque aqui não é lugar para isso. E pode ser um texto embaralhando, inclusive porque não me meto na área desde o ensino médio.

Das questões: estava num jardim onde existem somente duas grandes árvores, de fato. Num local curioso: suas raízes infincadas num quadrado minúsculo comparado ao tamanho das plantas, e fora isso e a outra parte que é o jardim, há um grande pátio utilizado como garagem. Para além dos portões, a cidade, com canteiros centrais, árvores aqui e acolá, principalmente dessas que podam as copas em formato de cubo e essas coisas feias. Mas fora isso, a selva de pedra.

Quando crianças lemos quadrinhos, vemos desenhos, estudamos que é bonito ser amiga da natureza. Ser camarada, é uma ajuda mútua o fruto que a planta te dá e o adubo que você presenteia em agradecimento e coisas do tipo. Mas então por que quando crescemos há esse distanciamento? Esse ódio, essa não preferência pelo natural, essa sede pela "civilização", civilização essa que apenas preenche todo o espaço possível com concreto e edificações lucrativas, que impermeabiliza o solo e provoca enchentes e outros graves problemas ambientais - lembrando aqui que ambiente é não apenas a parte verde de um espaço.

Já que citei o museu, acho de bom tom falar um pouco de Manequinho Lopes por aqui. O que sei dele se deve a história oral, alguns objetos em exposição e clippings de jornais, sobretudo de sua coluna Assumptos Agrícolas, n'O Estado de S. Paulo, existente entre 1918 e 1938, ano de sua morte. Época entre-guerras, primeira metade do século XX. Entomólogo, caricaturista e jornalista, ele hoje tem seu nome no Viveiro Municipal que se encontra no Parque do Ibirapuera, e não é por acaso. Combatente das pragas do café e do algodão, ele também remodelou parques de São Paulo e do Rio de Janeiro, trazendo flores a todas as estações e pássaros para esses ambientes, por saber o que, quando, como e onde plantar. Levava consigo um guarda-chuva não importando o tempo, para cutucar canteiros da cidade, certificando-se se estava tudo bem. Preste atenção na imagem a seguir. Veja a data.

Visitem o Museu Vicente de Azevedo para conhecer Maneco

A Encíclica do Papa Francisco, disponibilizada em junho, tem o mesmo viés. São noventa anos entre esses textos, são homens em posições diferentes, são mundos temporal e espacialmente diferentes. Mas o mesmo tema e a mesma súplica, a mesma crítica. Meu dileto Eça de Queirós já fez um belo livro sobre o tema em 1901. A crítica à industrialização desenfreada, o progresso, a civilidade e todos os adereços do personagem Jacinto em Paris e sua volta ao campo português (portanto de volta ao país natal) e modo de vida totalmente diferente. Pode-se dizer que seja só o voltar para sua terra toda a questão do livro, mas me é evidente essa separação do cinza e do verde na obra A Cidade e as Serras. Li na época dos vestibulares e isso já faz um tempo, mas não me esqueço de como foi gostosa a leitura, a descrição dos espaços era quase palpável. Com menos carinho cito também Inocência, do Visconde de Taunay. Romantismo no interior do Brasil, bem do jeito que eu gosto.

Ricardo Siri Liniers

A questão que mais me chamou atenção além de que esse tema não é coisa de O dia depois de amanhã, Protocolo de Kyoto ou Rio 92, mas de outras décadas e até séculos, é que existem diversos tipos e tamanhos de vegetações - e estas nascem e morrem sem muitos de nós termos ideia de como é ver ao vivo e a cores, cheiros e sabores. E sou pessoa urbana, 90% urbana, digamos. Moro num local com resquícios de mata atlântica, que por problemas de políticas públicas perde de tempos em tempos mais chácaras, mais terrenos, porque oras, as pessoas precisam de um lugar para morar e a cidade, o estado o país, não suprem. Mas ainda aqui existem glebas, plantações, pinheiros, etc. Me é normal conviver com esse espaço - que já é quase interior -, mas ainda assim é um relacionamento distante, por mais que fisicamente seja o contrário.

Nos dois anos que morei na Paraíba vivi no brejo paraibano, meus avôs tinham sítios no interior e ali na caatinga quando seco é só terra e arbustos, plantas rasteiras com galhos em mais quantidade que folhas, mandacarus, etc. É lindo, é talvez meu lugar favorito no mundo - aliás, é de fato meu favorito, porque adoro terra, marrom, o clima, o calor. Possivelmente seja tudo isso por nostalgia, porque cresci lá, aprendi a falar e a andar por lá. Mas enfim. Conheço também as Cataratas de Foz do Iguaçu - PR, o caminho para o Vale do Paraíba, para o litoral e só. E ah, plantações de soja e canaviais. Mas vejam só vocês, urbanos como eu: e o cerrado, a mata atlântica de fato, a Amazônia inteira, as estepes, desertos, oásis, florestas temperadas, etc.? (Saudades Geografia) A caatinga já perdeu boa parte de seu território, assim como a mata atlântica e o serrado. Quando li um texto sobre a perda significativa caatinga alguma coisa morreu em mim. Me espantou também a importância das abelhas relacionada com o perigoso caminho da extinção, o impacto que isso causaria. Mas essas são questões técnicas e de outras áreas. É bom estudar presente e futuramente, porque vivemos e viveremos nesse mundo.

Falei sutilmente de morte acima. Minha definição de morte, e eu disse num comentário de blog porque se assemelhava a de uma amiga, é um lugar que me parece nosso planeta virgem, digamos assim. Não destruído e sem criações humanas, apenas eu e esse espaço, com um caminho curvo para a direita e uma montanha na qual a beirada é essa curva, e um campo enorme para eu poder deitar, apoiar a cabeça numa pedra, e no silêncio sentir o vento. Sem falar ou ouvir ninguém, nem mesmo creio que existam outros animais nessa morte idealizada. Eu sinto isso - e sentia muito mais - quando ouço High Hopes. Mas sinto mais ainda, profundamente e sempre, quando ouço Réquiem para uma Flor. Curiosamente as duas músicas falam de natureza, cada uma com seu propósito e suas metáforas, mas a escolha das palavras que remetem o verde é significativa. Vou deixar o videoclipe de High Hopes aqui porque é lindo, e os campos me lembram os campos dessa morte (e é por isso que relaciono com o filme O Sétimo Selo, mas fica para outro texto). Mas sugiro o escutar Réquiem para uma Flor, porque é uma bela e pequena canção, com um poder sensorial imenso.

Não foi um post ecológico ou informativo, nem pretendi que o fosse. São só questões que me vem em mente e fogem como a brisa quando encosta no braço da gente e se vai, para esbarrar em outro braço. Resolvi escrever pela agonia que me dá não registrar sensações importantes, mesmo que de maneira torta ou embaraçada. Não tenho tanta fé na humanidade assim para acreditar que vamos reverter essa destruição de alguma forma, mas pretendo aproveitar o quanto posso enquanto há.

Fruto do mundo, somos os homens

Ainda tenho em mim todo o sentimento do mundo

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Henri de Toulouse-Lautrec - The Hangover (Suzanne Valadon), 1888.
Achei que não gostava de poesia. Achei que odiava poesia. Mas conheci Neruda. Conheci Pessoa. Até aí tudo bem. Contudo, conheci Leminski e pensei: "nossa, que cara chato".

Então tem o Graciliano. Nordestino como meus pais, tios e avós. E o alagoano que se filiou ao PCB há 72 anos disse em suas Memórias do cárcere:
Comovo-me em excesso, por natureza e por ofício. Acho medonho alguém viver sem paixões.
Essa frase desse não-poeta está tatuada em minha alma. Porque sou e estou apaixonada, todos os dias, no bom e no mau sentido da palavra. No sentido de Camões.

Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?


E parece-me que a poesia só surte efeito quando você está dentro dela, vivendo-a, com o peito rasgado, ferido, e a cabeça quente, fervendo, derretendo, escurecendo as vistas.

Então hoje (23 de agosto) o almoço na fundação para a qual trabalho foi temático. As crianças assistidas pela fundação, e em parte pelo museu da fundação (sou mais ou menos professora, quando nunca, depois de grande, quis ser, e ainda bem que bebi dessa água que não beberia), fizeram trabalhos comoventes sobre a região Sul do país. A comida também fazia questão de lembrar o cotidiano sulista, talvez com estereótipos, mas pulemos a parte da comida do corpo direto para a comida da alma:

Estava lá, aquele que eu não aguentava mais ver estampado em páginas hipsters do facebook com seus versos burgueses paulistas mal feitos (da página, no caso, e não o artista em si), o tal do Paulo. Não só ele, mas a adaptação de sua obra em obras dos meus pequenos - que na verdade são mais altos que eu, no auge dos seus 13 anos. Além disso, seus versos, suas visões de mundo em poucas palavras, que eu, com tantas palavras ainda consigo conservar o meu silêncio e ser um mistério para mim mesma.

Releituras dos jovens

Reclamei aqui algumas vezes sobre minha dificuldade cada vez maior de expor sentimentos, que acontecia na mesma proporção em que me era cada vez mais fácil expor ideias. Um amigo disse que é porque na adolescência a gente só sabe dizer o que sente, porque só sente e pouco faz, profissionalmente falando. Na maturidade ocorre o contrário: nos dedicamos ao profissional e o sentimental vai enrijecendo, como uma máquina velha, deixada no canto para oxidar e criar teias.

Como sou uma pessoa carregada de memórias e nostalgia, e o afeto que sinto germina por essas vias, consegui reviver pedaços gostosos e dolorosos em mim neste último mês. Por ter estado apática nos últimos anos, essa re-vida foi algo apocalíptico como o Eclipse do Lado Escuro da Lua. Agora parece que abri o peito novamente, depois de um tempo mergulhado na racionalidade e nos sentimentos de rancor, culpa e pena. Por falta de costume, estou sem jeito, dolorida, cansada, desesperada, e cinco minutos depois estou serelepe, sorrindo, gargalhando - de euforia e desespero -, choramingando (porque não consigo mais - ainda - chorar direito {parece que consigo sim, de soluçar, aconteceu}), pensando, suspirando, falando sozinha.

Tanto pedi e busquei ter o coração batendo forte por tudo que faço e que me é caro, para me sentir viva, que me veio retumbar no peito algo além de minha capacidade física, algo que não cabe em 1,57 de altura, nem mesmo numa mente que se ocupa dezessete horas por dia.
Mesmo que me aperte essa sensação sem nome
Ou que me faça engolir a seco a minha sede é de...

O tempo, o que queremos e o que fazemos dele

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Ker-Xavier Roussel - Les Saisons de la vie, 1892
Hoje reli A Cartomante, e sinto ter pensado nessa história por algum motivo na metade do caminho entre casa de papai e trabalho. Aqueles pensamentos que aparecem do nada em nossa cabeça como o demônio Pazuzu em O Exorcista, ou as propagandas da Jequiti no SBT.

Mas não foi por apenas ter me lembrado de Machado de Assis que reli essa história - que adoro. Foi porque me sentei no ônibus ao lado de um senhor muito atrevido (não uso esta palavra nem no bom, nem no mau sentido).

Pois atreveu-se a interromper minhas músicas e comentar sobre o sol extremamente quente, que ele é feirante e aguenta, tudo bem. Falou de vitamina D e não ouvi, ordenou que eu tirasse o último fone de ouvido que restava. Mas não era a música que me impedia de ouvir, e sim que ele falava muito baixo (ou estou perdendo a audição). Perguntou meu nome, eu disse e ele comentou de uma rainha Helen cristã grega do século XV a.C. (seria a mulher de Menelau e amante de Paris?). "Quem me vê não dá nada por mim", disse e comentou sua religião e que até lia mãos.

Olha, eu sou bem laica quanto a religião dos outros (e a minha própria, sou católica mas nem pareço), então a questão não é sobre acreditar ou não, ou o que é certo e o que é errado. Então ouvi muito educadamente o que ele tinha a dizer sobre minha mão esquerda, e desci em meu ponto habitual, agradecendo a conversa. Experiências, uma das graças da vida.

Não vou dizer o que ele me disse, nem sobre quem. Mas me incomodou o que ele disse no sentido que explico a seguir, e que tem a ver com várias coisas no passado que me fazem pensar a vida, o universo e tudo mais.

Detesto saber do futuro. Fico ansiosa para que ele chegue, claro. Fico muito nervosa para saber o que vai acontecer sobre coisas e pessoas que quero muito bem e que quero por perto. Até passo vergonhas por conta disso, mas prefiro toda a minha angústia do que saber o que acontecerá. Até porque odeio definições vai acontecer isso, as coisas são assim, sempre foram, sempre serão. Me diga isso e lutarei com a vida para provar-te o contrário. Meu destino sou eu.

Ontem infelizmente a televisão estava ligada e tive que assistir o fantástico. Casa de papai é idiocracia e não tem como se desvencilhar daquele mundo. Pois me apareceu um robô com inteligência artificial, e querem saber? Eu acho isso uma merda. Com o r mais arrastado que possuo de meu quase paraibanismo, eu acho isso uma m-e-r-d-a. Dez minutos de entrevista com cientistas, com o próprio robô, sobre a possibilidade de se viver duzentos anos e tomar injeções que renovem seu DNA, e como não será preciso tentar ser saudável se alimentando daquilo que a terra dá, e eu gritando dentro de minha cabeça DISTOPIA!

Deus me livre de eu viver no Admirável mundo novo. De viver duzentos anos. De ser fisica ou mentalmente eterna. Quero, sim, ser eterna: em minhas palavras, em meus estudos, em meus aprendizados, ensinamentos, bens materiais relativos a meu trabalho e sentimentos. Mas nunca quero viver para sempre. Nunca quero viver duzentos anos. O caminho da vida é a morte. E o homem busca se artificializar. Acho isso horrível. Não compreendo o dinheiro gasto com essas pesquisas. Nem com a possibilidade de se mexer em um feto para evitar certas coisas que podem nascer com ele. Porque compreendo más formações etc., mas bem sabemos que quem tem dinheiro tem poder, e se quiserem mexer num feto para mudar cor de olhos, de corpo, textura de cabelo, data de nascimento, capacidade cerebral, tudo pode acontecer. Essa parte do feto foi discussão levantada em um grupo de filosofia sobre ética.

Pois bem. Também tenho horror a máquinas do tempo. Viajar para passado ou futuro. Isso acaba com a história. Você voltar fisicamente ao passado e mudar uma cena é como derrubar uma peça de dominó em uma fileira. Criança adoraria viajar no tempo e eu só digo "que horrível!", e comento, para reflexão, sobre a cena do De Volta para o Futuro, onde Marty McFly passa a sumir da fotografia da família junto dos irmãos porque impediu, quando estando no passado, o encontro e apaixonamento de seus pais. É pesado. Claro que o mundo muitas vezes é uma bosta, mas poderia ser pior. Melhor também, mas a história é o que se ajeita aqui se bagunça ali, e assim caminha a humanidade.


oh no
Então, respeito a leitura aleatória e quase impositiva da minha mão. Mas o que faço com as informações obtidas é escolha minha, não posso julgar ninguém previamente, evitar situações porque alguém me alertou de algo muito antes de acontecer, nem ficar com isso em mente e tomar decisões a partir disso. Camilo acreditou piamente (porque queria acreditar) que estava tudo bem, porque assim disse A Cartomante. Aconselho a leitura aqui, no domínio público. São 8 páginas, para quem se importa tanto assim com quantidade de texto. Há também a maldição de Laio, pai de Édipo. Prefiro não saber e decidir o que tiver que decidir em seu devido tempo. É como signos, acredito, mas não sigo o horóscopo do dia, porque não se trata disso. Nem vivo em função disso. Não é questão de acreditar ou não naquele senhor, ou dizer que ele está errado. Até porque ele não disse para eu fazer nada. É mais dizer o que faço a partir desse ponto. E que vou fechar minhas mãos sempre que andar próxima a alguém que queira puxar assunto.

Mentira nem to com raiva, mas o Bruce Lee é lindo

“rico só é o homem que aprendeu, piedoso e humilde, a conviver com o tempo, aproximando-se dele com ternura, não contrariando suas disposições, não se rebelando contra seu curso, não irritando sua corrente, estando atento para o seu fluxo, brindando-o antes com sabedoria para receber dele os favores e não a sua ira; o equilíbrio da vida depende essencialmente deste bem supremo”
Não posso dizer que concordo ipsis litteris pois ainda estou lendo, porém esse livro é maravilhoso. E escrito numa velocidade que considero a minha de ser.

P.S.: esse post nada tem a ver com Dr. Who. A série, por mais que não assista, é legal. E a cena do Van Gogh makes me cry (e o ator é lindo).


o modezu
P.S. 2: amo buracos negros, de minhoca, física quântica. Me indiquem textos e vídeos sobre. Adoro ficção científica também, nada me impede. Como disse, meu destino sou eu, e nesse caso meus gostos também, obviamente.

P.S. 3: falei de fones de ouvido, e de Laio. Me veio em mente esta música. Coincidência? Acho que não.

Bright and dark sides

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Gustave Caillebotte - Rue de Paris, temps de pluie, 1877
Me baseei nesse texto da Gabriela para criar uma lista de coisas gostosas que animam meus dias. Porque há dias tão intensamente tempestuosos que simplesmente nublam qualquer possibilidade de boa atividade, me fazendo não enxergar alternativas e fazendo chover em minha cabeça. Não vou elencar tudo, infelizmente. Mas, para me lembrar melhor dos momentos, é bom pensar em rotina, em horários. Eis aqui meu lado brilhante da vida:


Gosto de me espreguiçar pelas manhãs, antes de levantar da cama. Parece que antes disso sou uma pilha de ossos desmontados. (Vocês - pelo amor de Deus - já assistiram Funny Bones?)


Sou apaixonada por rostos que acabaram de acordar, inclusive o meu. Uma pessoa que acabou de acordar, com o cabelo assanhado, a cara de "onde estou, quem sou eu, o que está acontecendo?", as olheiras vermelhas (eu adoro olheiras, sabe; e ainda bem, porque nasci com elas), a voz rouca, a preguiça, a desorientação e, no meu caso, o silêncio. Não interessa se estou de bom ou mau humor, eu de manhã falo muito, muito pouco, quase nada.

Cafuné!

Café!

Ir para lugares ouvindo música e prestando atenção na paisagem. Quando é um caminho que gosto muito e a distância se mede temporalmente em mais de uma hora, com certeza estarei ouvindo o disco Live at Pompeii, do Pink Floyd. Também adoro ligar o som e dar um cochilo, dependendo do horário, e se estou sentada no ônibus.

Dar bom dia a desconhecidos. Sorrir para eles, sabendo que essa é a única vez na vida que nos encontramos, provavelmente, e cordialmente trocamos coisas boas num gesto simples, rápido e indolor. Quando acontece de nos revermos, de nos reconhecermos, é melhor ainda. É uma amizade sem nome e sem compromisso nenhum.

Andar e observar - de novo - a paisagem. A arquitetura das casas, o modo de viver dos bairros, sentir o vento e ouvir os passos. Dar oi pro gato naquela garagem, sentir medo do gnomo daquele jardim, fotografar aquela flor e querer saber a cor da tinta daquela parede. Tenho o costume, desde sempre, de observar casas e apartamentos, fragmentos internos, e imaginar toda uma vida. O que o marido está assistindo, o que a mulher está fazendo, os gostos dos filhos, os empregos, preocupações e motivações de vida de cada um (como pessimista e intolerante a padrões que lê Buk e Dosto e ouve Raulzito, eu acho essa rotina toda um saco - mas esse jogo de adivinhação é uma delícia).

Bares. Não botecos-boutiques da Vila Madalena (Vila Madá para os paulistânos, mêo), mas os bares verdadeiros, com caixas de cerveja empilhadas, prateleiras tortas e garrafas diversas com conteúdos também diversos e às vezes sem rótulo, um balcão, o dono e um freguês, uma televisão com futebol, noticiário ou uma conversa. Um comentário. E, neste momento, meus amigos, que se exploda o politicamente correto. A simplicidade, crueza e ebriedade de um bar para mim é a mais pura poesia e humanidade. Mesmo que... não, não interessa o assunto e a opinião.

Atravessei a rua, entrei numa bodega.
- Faz o obséquio de me dar um pouco de aguardente?
O homem da venda trouxe a garrafa, pôs-se a despejá-la num copo sujo.
Como eu não o interrompesse, derramou a bebida com sovinice.
- Quer que encha?
- Vá botando.
- Ah! bom. É o que se leva deste mundo, opinou entregando-me o copo cheio.
Sentei-me e comecei a beber, olhando a casa fronteira, o pensamento espalhado.


Aquele momento que fico tão completamente empolgada que gaguejo, balanço os braços, digo as coisas todas na ordem errada e quem me ouve dá risadinhas. O mesmo quando eu sou a ouvinte. Tipo cena de insight de filme de mistérios e aventura, onde dois personagens perambulam pela sala com cara de interrogação, simultaneamente lhes aparece a exclamação e, por algum motivo, possuem uma fala sincronizada de eureka tão ou menos inexplicável que um musical com toda a cidade desconhecida entre si dançando e cantando do mesmo jeito. Amo (só não amo musicais). (p.s.: os vídeos a seguir possuem spoilers)


Minha linha de pensamento é idêntica a do Todd e kkkkk adoro esses filmes bestas do Nick Cage

Café novamente! Mas não o simples ato de bebê-lo. É esperar um dia inteiro pelo café da tarde e ter o prazer de ouvir a água quente jorrando por cima do pó, fazendo subir um aroma indescritível de paz. Café com mamãe e biscoitos da casa do norte, café sozinha com anotações em minha caderneta e suspiros apaixonados ou preocupados, café na pausa do trabalho com causos e uma boa prosa, café para aguentar as próximas oito horas, para me inspirar, me motivar, lembrar que a vida não é só problemas. Café.

fonte. russa, é claro
Cheirar gatinhos. ... Literalmente: pegar as gatas aqui de casa e dar um chêro e fazer carinho até ronronarem e ficarem doidas se esfregando, abraçando, lambendo, arranhando, dando chutes e correndo para se esconder e pular na minha perna, brincando. Carinho gatos a qualquer hora e em qualquer lugar. Queria ter essa habilidade de brincar com cachorros, tadinhos. Tenho duas e não dou a atenção merecida (... voltemos à parte boa).

Comer salada de frutas. Mas pelo amor de Deus, sem leite condensado, isso é criminoso. Salada de frutas é com frutas e o único líquido deve vir da maior fruta de todas, que é o suco de laranja. E só. Amo muitas comidas mas essa é aquela que a gente ama tanto que esquece de mastigar direito e quase se engasga e quer enfiar na cara (talvez eu seja uma comedora aflita, não façam isso em casa).

Dormir ao som da chuva, ventania, sapos, grilos, ou cães latindo ao longe. Dormir de cansaço e nem sonhar (eu sonho muito, não aguento mais).

E a mais novíssima melhor sensação de todas do momento: ir dormir com essa trilha sonora, in a specific way. Is such a heavenly way to sleep.

28. C'est la vie

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Krzysztof Kieślowski - La double vie de Veronique, 1991.
Tenho costume de usar termos estrangeiros em algumas conversas. Não que eu seja fluente na língua - por exemplo, não sei latim, mas já soltei um ipsis litteris no meio de um seminário, de nervoso -, ou seja empreendedora™ que solta um startup, follow up, feedback, new car, caviar, four star daydream, think I'll buy me a football team, I'm all right, Jack, keep your hands off of my stack. Não, longe de mim. Mas às vezes a gente solta um je ne sais quoi, um c'est la vie... Porque, bem... c'est la vie...

Então usei o último termo do parágrafo anterior em uma conversa e me lembrei de Emerson Lake & Palmer, uma de minhas bandas favoritas de rock progressivo, que me lembra as trilhas sonoras de Peanuts [1] e Tom & Jerry [2] (lembrando que meus episódios favoritos são os polêmicos ilustrados por Gene Deitch), e de Inferno, do Dario Argento. O Keith Emerson é (foi) um tão excelente musicista, e com um som tão específico, que até a leiga aqui em teoria musical sabe muito bem distinguir quando o piano está sendo tocado por ele.

Enfim, esses dois parágrafos confusos só existem para introduzir a música Money, do Pink Floyd, e o que vem a seguir. Estou tentando montar meu 30 day music challenge, e hoje respondo o dia:

28. a song by an artist with a voice that you love (uma música por um artista com uma voz que você ama)

Greg Lake. Poderia ser Ian Gillan, mas... Greg Lake. Ele é o L de ELP, o Lake de Emerson Lake & Palmer. E o segundo dos que se foram (só Carl Palmer, o baterista, está vivo).

Obviamente a música não poderia ser outra:

Like the sea
There's a love to deep to show
Took a storm before my love
Flowed for you
C'est la vie
E, para comprovar o que estou dizendo, caso a estrofe acima não tenha tocado o seu cuoração, tem também essa abaixo. Porque Greg foi o primeiro vocalista (e baixista, isso é muito importante) da banda King Crimson, mais conhecida por ter um cangaceiro na capa (mentira, é um Coringa, mas não custa nada sonhar) de um de seus discos e/ou por ter zero discos disponibilizados no youtube porque o Robert Fripp não colabora. Então, como o Fripp não colabora, admiráveis fãs isolaram a voz de Greg na música Epitaph, do primeiro disco, In the court of the crimson king, de 1968, que é, inclusive, um dos meus dez discos favoritos de toda a vida, e um dos classicões do famigerado prog.

Knowledge is a deadly friend
If no one sets the rules
The fate of all mankind I see
Is in the hands of fools
* Já postei o dia 01 do desafio.
[1]. A Charlie Brown christmas, de 1965, tem música composta pelo pianista de jazz Vincent Guaraldi.
[2]. Saturday evening puss, de 1950, é um episódio dirigido e escrito por Hanna-Barbera, e a música composta pelo pianista Scott Bradley.

Backups #1

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Depois de 11 anos na frente do computador, decidi que odeio redes sociais. Então o facebook tem o famigerado on this day, e até que não fomos pessoas tão vergonhosas no passado. Tem dia. Vou reproduzir aqui algumas coisas que não me arrependo de ter postado, para a posteridade. Porque até o fim do ano que vem crio coragem para apagar mais esta conta.

Começo pelo bônus, porque a melhor ilustração deste post vem dele.

21 de outubro de 2015.

[ B o n u s ] Essa pintura merece destaque, por n motivos.

Eugene de Blaas - O flerte, 1903.
22 de outubro de 2015.

Minha época favorita de Tom and Jerry é sob direção de Gene Deitch (1960-62) na Praga da então Tchecoslováquia, e produção da MGM. Você reconhece a época pelas caras e bocas do gato e do rato, o homem sempre tem um olhar severo e se irrita facilmente, assim como o dono de Tom, que noutros episódios busca pescar, relaxar com um café, ou algo assim. Amo os movimentos, cores, música, dublagem. Meu episódio favorito é Buddies Thicker Than Water, de 1962.
Acho o Gene de uma vanguarda total, diria até de uma psicodelia admirável. Hoje de tarde me lembrei de Bizet, e desse clássico a seguir:

 

***

Marquei como lido "A casa dos budas ditosos".

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As 19 Rapsódias Húngaras de Liszt

22 de outubro de 2013.

Estava ouvindo Syd Barret - Mek Weg!

***

Dorris McComics

***

Antonio Gramsci - Escritos políticos vol 2. II. A questão meridional: 1926. p. 415
22 de outubro de 2011.

O cabelo absurdamente lindo e a vida parecia resolvida. Doce ilusão dos 19 anos.
***
Nininha com 4 anos e as orelhas inteiras (agora tem 10 anos e uma orelha murcha)
22 de outubro de 2017.

Hoje em dia esse tipo de coisa faz sentido em minha vida, estou só aqui bebendo, cheirando incensos e pagando contas.

27. Iracema

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Costumo dizer que odeio São Paulo. Pois é. Nem sempre. Gosto do que São Paulo foi, e do que poderia ter sido (infelizmente sempre prefiro o que poderia ter sido do que o que é, isto causa muita dor). Gosto da São Paulo dos (i)migrantes. Do centro histórico, das atividades culturais (nem todas, mas cada um com seu cada qual), de edifícios históricos, mesmo aqueles de arquitetura fascista. Das periferias, favelas. Do Brás.

Ouvir a voz rouca e rasgada do Adoniran é amar São Paulo. É chorar São Paulo. Não pelos paulistânos e paulistas "tradicionais", quatrocentões, de modo algum. Mas pelo trabalhador que construiu a cidade, que levantou-a do barro e que, de um lugar inacessível e inóspito, a fez centro econômico e metrópole que acolhe diariamente milhões de pessoas de todos os cantos do mundo. Seria lindo, se não fosse trágico. Trágico, porque há xenofobia e mixofilia. Desigualdade social, econômica, e por aí vai.

Não posso dizer "mas vamos falar de coisa boa!", porque o post é mesmo trágico. É a história de Iracema, é a música que me parte o coração.

27. a song that breaks your heart (uma música que parte seu coração)


De vez em quando, geralmente quando estou triste, minha playlist (antes de me interessar pelo post-punk britânico) certamente tem Nelson Gonçalves, Bezerra da Silva e Adoniran Barbosa.

Mamãe sempre cantou o trem das onze, e até vivo como os moradores do Jaçanã que não podiam perder o tal do trem das onze, o último da noite. Porque moro em periferia, distante de tudo. Tanto, que teve um dia, curiosamente dia em que vi ao vivo Demônios da Garoa, que chorei Iracema, sorri e apertei a mão de Dedé Paraízo, que cheguei com mamãe bem depois das onze no terminal de ônibus, e só amanhã de manhã (sorte que tinha o tal do uber e a casa de um amigo próximo, com festa; regalias que não existiam em meados do século XX). Além de morar longe e correr o risco de perder o último transporte da noite, ainda passo todos os dias mais ou menos pelo caminho do antigo trem, entre trabalho e escola, que subia do Tamanduateí para Guarulhos, e passava pelo Carandiru - e Jaçanã.

Voltando à Iracema. Me senti Adoniran quando ouvia os Demônios e chorei, eu chorei de dor porque, bem, a vida não é lá essas coisas que a gente acredita na juventude. Ainda tenho abissal dificuldade em dizer meus sentimentos, então recorro às artes audiovisuais e textuais. Me mascarando em coisas já ditas, me sinto protegida, porque qualquer coisa eu digo que não sou eu, é a música que está falando, olha só. É aquele texto com referências e ABNT. Eu apenas concordo, não quer dizer que eu sinta, ou que eu seja. Mas é: eu sou tudo isso sim, apenas covarde e pequena.

Me senti Adoniran, porque Iracema, eu nunca mais eu te vi. Porque Iracema, eu perdi o seu retrato.

Não sei se é assim com vocês, mas enquanto me lembro de datas, e associo  com cré, minha memória visual é bem comprometida. Tudo me lembro atrás de nuvens, mesmo que tenha acontecido uma hora atrás. E me forço a lembrar revivendo momentos. É até interessante essa parte, porque me lembro das aulas da professora Sandra e ela explicava sobre temporalidade, testemunhos, etc.

Lembro de algo como que a memória se confunde muito com a imaginação. E como as lembranças são efêmeras, para compôr uma linha do tempo decente nosso cérebro vai inventando o que perdeu de informação. É como um restauro mental: fica parecido com o que foi, mas já não é mais. Até o momento em que o frágil papel da memória se dilui e tudo o que se tem é o material enxertado, posterior, não original.

Quando ouço de lembranças guardo somente suas meias e seus sapatos, Iracema, eu perdi o seu retrato, me sinto o noivo de Iracema, faltando vinte dias para o nosso casamento, naquela confusão do público em volta do corpo outrora pinchado no chão da avenida São João, recolhendo suas meias e seus sapatos. Naquela época registros fotográficos não eram como hoje. Uma fotografia era cara. Mas Iracema se manteve viva no coração de seu noivo e na música de Adoniran Barbosa.

Avenida São João, déc. 1950.
Por que essa música é tão importante? Porque como zelo pela memória, levo muito da minha profissão para minha vida pessoal. Então Iracema não só morreu. Morreu também sua imagem, a da fotografia perdida. Futuramente, não haverá nenhum testemunho da história de Iracema, de tantas Iracemas. E saber que isso é tão completamente possível, dá um aperto no peito e real vontade de chorar. Então, assim como o noivo de Iracema, nos apegamos às meias e aos sapatos, para ao menos fingir que a pessoa está ali, conosco.

Há uma questão que professora Sandra também dizia nas aulas. "Uma árvore caiu no meio de uma floresta. Ninguém viu. A árvore caiu?" - como dizer que sim, se ninguém viu? Que árvore? Que floresta? Se ninguém viu, não aconteceu. Então, tem também tem essa citação que encontrei num livro da biblioteca do museu:
No México existe a crença de que cada pessoa morre três vezes:
A primeira é no momento em qua suas funções vitais cessam.
A segunda é quando o seu corpo é colocado na tumba.
A terceira acontece em algum momento no futuro, no qual o nome do falecido é pronunciado pela última vez.
Aí então a pessoa realmente morre.
Ted Klein para a Roots Web Review. (apud. REZZUTTI, 2013, p.267)
Parece um texto sobre morte. Mas não somente. É sobre perdas, sobre momentos findos, tempos que não voltam mais. Sobre não ter o timing. Não aproveitar o presente, ou querer tanto aproveitar todo o presente que a profundidade dele é pouca e se anuvia facilmente. A São Paulo que não é, a Iracema que foi minha, e nem o retrato dela tenho mais. O caminho que estava traçado e foi riscado. A não preservação de indícios, o desconhecimento da História. A memória que falha, a imaginação que confunde, a expectativa que se cria, a decepção que chega a galope (e é culpa do que expecta). O abandono, Iracema, meu grande amor foi embora.





Mamãe e eu, Dedé Paraizo e os Demônios da Garoa.

* Este post faz parte do 30 day music challenge. Leia mais.

et cetera

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Claude Monet - Water-Lily Pond and Weeping Willow, 1916-19.
Hoje é aniversário da minha mãe, e ela teve uma festa surpresa na casa da minha avó que lembrou meu aniversário de um ano de idade. Porque foi minha tia quem fez. Não vou me estender muito no assunto (vamos deixar para outro aniversário), porque tenho vários trechos de coisas a dizer.

Domingo fui me lembrando de diversos momentos da minha vida e coloquei no twitter. Estava ouvindo Zé Ramalho e lembrei da infância, de quando vi pela primeira vez a foto do meu pai criança e como chorei, etc.

Anteontem eu precisava escrever uma bio a pedido do meu camarada para me apresentar como parte da equipe do filme-c. Estava devendo há semanas, não sabia o que dizer. "Historiadora, só?", ele brincou. Daí eu percebi que minhas bios são isso. Não sei brincar com palavras quando é para escrever uma frase. Preciso de um texto, porque tudo que digo vai com uma introdução, geralmente memórias, que vão puxando memórias, e nem sempre isso fica claro para quem está lendo: "o que é que tem a ver?".

Talvez esse texto esteja ficando confuso, e eu poderia até culpar a Maria Joana que aqui passou. Mas não é, a mente da gente ferve momentos.

Senti vontade de ouvir o A saucerful of secrets, que é um disco maravilhoso do Pink Floyd, último com o psicodélico diamante louco Syd Barrett, de 1968. E eu fui lembrando não só de cenas, como sensações da minha vida. A faculdade, o caminho para ela, com quem me relacionei, como conheci a Mary Jane. Foi um momento pré-2013, então estávamos muito mais-ou-menos, obrigada, no que se refere a política, disputas e golpes. Muita coisa piorou desde então, inclusive minha relação com diversas pessoas que me lembram esse disco. Tem gente que nem falo mais.

Pois bem. Quando eu lembro desses momentos da minha vida, lembro de quem ainda sou. Quando lembrei da faculdade, a psicodelia. Quando, no twitter, lembrei como conheci Lampião e Maria Bonita aos cinco anos de idade, lembrei do meu talvez primeiro sentimento político. E um levou ao outro, de certa forma, já que os dois têm ligação por minha absoluta paixão pela História.

Quando lembro dessas coisas, sinto que "desfragmento" meu cérebro, fazendo com que volte para os eixos, e faz sentido todo tipo de escolha importante que fiz na vida, o que me ajuda a pensar nos meus dilemas atuais. Nada faz sentido se você não analisa outros momentos. As memórias. Deve ser terrível não tê-las, se eu pudesse faria com que todo mundo tivesse seu "backup" seguro em algum canto, e que não tivesse validade.

É por isso que fico realmente furiosa quando dizem que "quem vive de passado é museu". Quando "não sei, sou de humanas". As boas memórias nos dão tantas ideias, tanta força, motivação, explicam coisas que a gente nem imagina. E são ativadas por meio de cheiros, objetos, cores, sons (a música é um ótimo ativador de lembranças).

É muito importante - pelo menos pra mim - a vida fazer sentido. É encontrando sentido nas coisas e relação entre momentos, temas distantes, que me sinto motivada a viver. A aventura não está no Indiana Jones ou qualquer personagem correndo e atirando por aí, descobrindo mistérios em lugares ditos exóticos (ou seja, não europeus/ocidentais/de língua inglesa). A aventura é justamente a nossa capacidade de do nada formar um quebra-cabeça interessantíssimo.

O título do texto é et cetera porque o já referido amigo botou no facebook uma lista que alguém escreveu e não me recordo (o computador trava se eu pesquisar), catalogando os bichos - acho que é isso. Das mais confusas opções, decidi que sou da categoria et cetera. Se for me apresentar a alguém, sou Helen e et cetera. Porque até eu me explicar e decidir quem eu sou, já contei a minha vida toda.

É muito fácil, numa conversa, eu te dizer: "isso que você disse me lembrou uma música", ou "me lembrei de quando, em 1999, eu fiz isso e aquilo outro", ou ainda "essa música me lembra o cheiro x". O que me lembra (não disse?) que percebi hoje no metrô que essa tal Jojo Moyes e as cores de seus livros me lembram bolo rosa com recheio doce carregado no creme de leite. Sinestésico assim.

E falando em sinestesia, no disco que estou ouvindo, tem a poderosa Remember a day. Essa música é úmida. Sempre me imagino numa floresta temperada depois da chuva, olhando de baixo para cima aquelas árvores bem altas, naquele olhar de criança que enxerga tudo exageradamente maior. Aquele cheiro de terra molhada (não pensem em Sandy e Junior), uns cogumelos ali (eu tenho medo, mas compõem o ambiente), uns duendes de capuz vermelho, bem na ideia psicodélica setentista. O Rick Wright é muito maravilhoso, vocês deveriam ouvir.

Remember a day before today
a day when you were young
free to play along with time
evening never comes

Esse texto não tem motivação não, tá.


3. La belle de jour

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Luis Buñuel - Belle de jour, 1967.
A gente possui certezas que, conforme o tempo passa, se tornam incertas. Acreditei por semanas que postaria Going to California, do Led Zeppelin, porque me lembra um dia específico em que fui à praia. Contudo, a companhia hoje me traz lembranças desconfortáveis porque houve (mais de) um grave rompimento familiar.
I think I might be sinking
Throw me a line if I reach it in time
I'll meet you up there where the path
Runs straight and high
Então hoje estou recordando, remoendo, com remorso de certas coisas do passado (que nada têm a ver com questões familiares porque, afinal, parente é serpente), e consegui ficar pior ainda ouvindo Alceu. O Alceu, que é a alegria de todos os artistas vivos que adoro e que são do nordeste. Não que seja uma surpresa, Anunciação sempre me deixou cair num poço incrível de existencialismo desde minhas épocas de catequese, quando entoava com a criançada (que eu detestava) essa música (que eu amo).

Não é Anunciação que me lembra do verão. Já já eu digo qual é, porque tem outras coisas a serem ditas na frente.

Esta cidade teve seus bons momentos (até as últimas eleições), que não aproveitei tão bem assim, porque quando o presente acontece a gente tem muita folga e deixa tudo pra depois; como diria Sua Mãe, eu estava entorpecido com outras paixões e ainda era imaturo para me jogar. Mas se teve algo que aproveitei 99% foi o Alceu.

Teve Alceu no Sesc Itaquera. Bem na hora de eu sair de casa lembro que choveu bastante, era domingo e eu disse Berenice, segura, nós vamos bater., e me lembro de chegar ao final de Cavalo de Pau. Foi maravilhoso dançar na lama num final de tarde, dançar até o pagode russo, porque na dança do cossaco não fica cossaco fora. Isso foi março. O ano correu de uma maneira que parecia bom, mas tava ruim, e parece que piorou. 2015 foi complicado, não é mesmo?
Teu coração tá batendo
Como quem diz:
"Não tem jeito!"
O coração dos aflitos
Pipoca dentro do peito
Então teve o Bloco Maluco Beleza no Parque Ibirapuera em janeiro. Um calor de rachar. Fafá de Belém cantando Vermelho até em versão Maracatu (spoiler: todas as versões são iguais, você só está bêbado) no trio de Alceu, fingindo que não havia votado em Aécio. Muito calor, muita gente pulando e bebendo e eu sóbria pois garrafa de vidro infelizmente não pode e eu sou enjoada e odeio cerveja. Odeio multidão, mas amo Alceu, fiquei pistola mas foi maravilhoso. Pena que. Tem coisas que a gente parece que saiu de um livro do Dostoievski e fica imaginando desculpas pessimistas para não agir. Momentos. Remorsos. Ai, Jesus.
Conclusão final, senhores: é melhor não fazer nada! É melhor a inércia consciente! Pois, então, viva o subsolo! Apesar de eu ter dito que invejo o homem normal até a minha última gota de fel, nas condições em que o vejo, não quero ser ele. (Embora não pare de invejá-lo; não, não, o subsolo, em todo caso, é mais vantajoso!) Ao menos, lá é possível... Ah! Estou mentindo agora também!
Daí teve Alceu no meu bairro mesmo. No meu bairro não tem nada, é tão periferia que luz elétrica da AES lá em casa só foi existir em 2015; que não há museu, centro cultural, biblioteca pública ou registro histórico para os ocupantes saberem quem são, de onde vêm e nem podem pensar para onde vão. Mas tem escolas públicas e um CEU. Pois foi nesse CEU que consegui levar mamãe pra ver Alceu. Dessa vez não foi nem grande show, nem trio elétrico; foi mais ou menos um acústico, com o mesmo script, mas parecia até novidade. Foi lindo e íntimo demais. Era frio, era junho de 2016. Um ano também complicado, obtuso. Triste.

Enfim, dos meus três momentos ouvindo os repentes de Alceu e as piadas sobre a música da muriçoca, em todos eles, não importando a estação do ano e as condições climáticas, eu lembro da moça bonita da praia de Boa Viagem. Essa música me dá uma coisa. Acho que o azul em que a Belle de Jour viajava é o azul em que me perdi e tenho me afundado. Para quem fala inglês, parece que o azul é um estado de espírito. Aqui temos a segunda-feira cinzenta, lá eles têm blue mondays. Hoje é segunda né. Tô triste. A frieza do azul me gela quando ouço essa música, inspirada num filme de Buñuel. Mas, ao mesmo tempo, o azul é a cor mais quente (não é só o filme não, é a física que diz) e queima meu peito e fica esse sentimento estranho e profundo dentro de mim.

Portanto, não podia ser outra senão essa, ainda mais nas atuais circunstâncias. E tomara, meu Deus, tomara! que em Pernambuco eu termine meu 2017.

3. a song that reminds you of summertime (uma música que te lembra o verão)


La Belle de Jour
Era a moça mais linda
De toda a cidade
E foi justamente pra ela
Que eu escrevi o meu primeiro blues

* Confira minha lista do 30 day music challenge

4. Senhor cidadão

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giphy
2017 foi um ano imprevisível para meu coração, inacreditável para a minha mente. Nunca pensei que fosse acontecer o que aconteceu, que sentiria tanto assim, e que existam tantos "cômodos" em minha cabeça. O cérebro é um universo, e o coração um oceano tormentoso.

Por sorte, tive forças que me surpreendem toda vez que paro para pensar no assunto, e companhia de amizades antigas e novas, coisa que também não previ para este ano. Foi tudo tão intenso que dias pareceram durar semanas, mesmo que as semanas, em certos momentos, tenham voado como se fossem dias. Senti coisas por cinco anos, e só se passaram cinco meses.

Falta mais de um mês para a chegada de 2018, e não sou tão favorável assim a retrospectivas, mas não tem como não parar cinco minutos do dia e pensar caralho, como foi que isso aconteceu? Foram meses tempestuosos, com um prelúdio já no primeiro mês, clímax ali no meio, no inverno, e um desanuviar por agora, porém ainda em meio a tempestade.

Tem gente que chega pra ficar, tem gente que vai pra nunca mais.É algo que não dá para fazer muito esforço para prevenir: cada um com seu cada qual e vou respeitando decisões alheias, porque a idade vem chegando e com ela a necessidade de fazer escolhas, determinar prioridades. Minha prioridade é viver minha vida como acredito que seja correto, porque ela é uma só, independente do que filosofias e religiões afirmem. Não é possível parar de viver a vida que a gente tem para viver a de outrem (salvo situações específicas e extremas, ou seja, estou falando só do meu caso mesmo).

Então estou aqui estudando, frustrada com um tcc que sairá em dez dias, praguejando contra o mundo, mas principalmente comigo mesma por ser tão desorganizada e procrastinadora. No trabalho cada dia é uma odisseia; me desespero, mas sou apaixonada por emoção, dramas, aventura, coisas novas (sim, museu tem tudo isso: "quem vive de passado" tem muito o que fazer, muito em que pensar e até muita diversão - sim, estou falando com você, você mesmo que utiliza a frase quem vive de passado é museu, você vai morrer antes do natal).  Na vida pessoal, um a mistura de notas do subsolo, músicas tristes, poesia, dengo,ummagummae até um pouquinho do que se pode dizer de relevante sobre Bukowski. Mas é aquela coisa: viver cansa.

E que bom que cansa. Quando não faço nada, eu durmo mal. Preciso gastar as energias de dia para ter motivos para dormir à noite. É a mesma coisa na vida: ela precisa acontecer. E acontecer em diversos caminhos, concomitantemente. Porque se alguma coisa vai mal, outra coisa deve ir bem, para equilibrar. Para distrair, para dar esperanças, porque senão tudo vira frustração e desespero. Mesmo para mim, que estou desesperada todos os dias, até dormindo.

Parênteses: essa tarde mesmo, não estava fazendo nada e dormi mal; sonhei sobre um autor que falava da miséria humana no sentido filosófico, com um aluno meu falando sobre racismo e com um mendigo aparecendo em determinado espaço. Acho que o sonho nada tem a ver com o texto, mas achei um sonho pesado demais para um cochilo de sábado à tarde. Eu só queria descansar, sabe, e dormir muitas vezes me cansa. Dormir significa que vou mais uma vez entrar num trem, ônibus, metrô, avião ou carro. Que vou andar por plataformas e estações. Que vou trabalhar. Então tenho hora extra dormindo, não sei o que é sonhar com o nada mais. Meus sonhos são urbanos, conturbados, atarefados, arquitetônicos. Fecha parênteses.

Esses tantos acontecimentos amorteceram desgostos e pude seguir minha vida com certa paz. Fui racional e fria quando e com quem pensei que nunca seria, me senti uma mulher arretada demais. Fui emocional e calorosa quando e com quem nem pensei que daria mais tempo de ser, e me senti uma mulher indefesa demais. Foi um Deus-nos-acuda, fui Inaurafui Compadecida. Fui também indiferente. Mas sempre comovendo-me por excesso, por natureza e por ofício. Porque acho medonho alguém viver sem paixões.

Então hoje completo o quarto dia do desafio de 30 dias de música. Esse ano está tão confuso que nem tenho achado ruim lembrar de alguém com músicas que amo. E eu amo tanto esse artista (também a pessoa, mas isso é irrelevante), que nem lembrando de quem preferiu me esquecer, essa música fica ruim. Pelo contrário: ela é ainda mais forte e poderosa, e só se auto afirma, dado os acontecimentos recentes.


Se o caso é chorar, me recuso. Prefiro me defender com esse julgamento/questionamento maravilhoso, tropicalista, justo, que diz muito sobre todo aquele cidadão opressor: o político, o da elite, burguês e pequeno burguês, o chefe, seja o de fábrica, de empresa ou de família; coronéis saruê, o porco, o cão, a ovelha orwellianos. E, por falar em ovelha, continuo sendo, com muito orgulho (e às vezes com dor) a ovelha negra da família.

4. a song that reminds you of someone you would rather forget about (uma música que te lembra de alguém que você prefere esquecer)



Senhor cidadão
Me diga, por quê
Você anda tão triste?
Não pode ter nenhum amigo
Na briga eterna do teu mundo
Tem que ferir ou ser ferido
O cidadão, que vida amarga

* Confira minha lista do 30 day music challenge

Quando eu era pequena

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Ricardo Siri Liniers
Numa das diversas pausas da estruturação do tcc, encontrei essa coisa linda que Liniers postou hoje. Lembrei de mim.

Quando eu era pequena, corria da minha sombra, porque achava um desaforo ela passar na minha frente, e eu que devia chegar primeiro nos lugares. Nesses momentos a Helen de três, quatro anos, vivia com os olhos grudados no asfalto, preto, brilhoso, iluminado pela lua.

King Crimson - Larks' tongues in aspic, 1973
Também competia com a Lua. Eu andava, ela andava. Eu parava, ela parava. Por que me perseguia, pelo amor de Deus? Quem tinha que seguir em frente era eu. Papai dizia que Mãe Neguinha, minha bisavó - se não me engano, ou era conversa dele -, dizia que Sol e Lua eram um casal apaixonado. Mas brigaram, é por isso que há dia e noite, e desde então caminha a humanidade. Com um reatar desse relacionamento, ou seja, com Sol e Lua no nosso céu ao mesmo tempo, dinossauros voltariam a habitar o planeta. Acho que mamãe me explicava que não era a Lua que andava para me seguir, e sim a Terra girando, dia e noite, e eu dentro dela.

Eu dentro de mim. Quando era pequena, mais nova ainda, achava que era uma índia, com os cabelos nos ombros caídos, negros como a noite que não tem luar.  Passava em frente a qualquer espelho e via que não, então saía correndo, indignada. Eu queria ser índia, por algum motivo.

Por algum motivo, a despeito dessa revelação, eu adorava brincar com espelhos. Aquele espelho de moldura plástica laranja, eu sentava no chão de casa, lá em Paraisópolis, cimento queimado. Posicionava o espelho de todas as formas e via o mundo lá de dentro, com umas perspectivas que hoje tenho o enxerimento de dizer que eram até construtivistas. O mundo avesso, tão maior, tão cheio de novidades. Eu queria entrar lá dentro e viver ao contrário. A porta da direita que era na esquerda, esse tipo de coisa.

Dario Argento - Profondo Rosso, 1975. (David Hemmings)
Tinha também os sonhos. Falei aqui da última vez como sou uma (in)cansável sonhadora. Os sonhos de minha vida foram na infância. Teve um que eu realmente guardo no peito, se alguém tratar de simbologias por favor me contate. Estava de carro com papai e mamãe, minha irmã ainda não existia. Um calor dos infernos, a estrada para lugar nenhum. A paisagem era areia. Não dunas, mas aquela terra infértil de chão batido, de abandono. Papai parava o carro no meio da estrada onde existíamos apenas nós três. Parava posicionado em frente a um edifício, mas numa simetria digna de filmes do Kubrick. Este edifício era absolutamente retangular em todas as suas formas, preciso e interminado. Ninguém na obra. Blocos de cimento, tudo cinza e poeirento como cimento que nunca viu água. Novamente a minha visão construtivista do todo (provavelmente porque eu era criança e tudo era gigante e infinito de minha perspectiva), e nós três encostados no carro olhando, como Ferris, a namorada Sloane e o melhor amigo Cameron (ou seja, eu mesma) observando um a obra de arte em um - cóf cóf - museu.

Eu pensando no meu sonho até hoje, já são 20 anos.
"The closer he looks at the child, the less he sees, of course, with this style of painting. But the more he looks at it, there’s nothing there. He fears that the more you look at him (Cameron), the less you see. There isn’t anything there. That’s him."
Tive outros sonhos com edifícios. No passado era às vezes, hoje em dia é todo dia. Impressionante mesmo, acho que vivo uma vida número dois quando fecho os olhos. Edifícios hoje são meu tema de tcc, com a limitação de me ater a bibliotecas públicas. Porque edifícios sempre me impactam, desde as igrejas, que só me interessam se são "muito arquitetônicas", como o meu favorito Mosteiro de São Bento, até aquela exposição sobre o construtivismo russo com fotografias de Aleksandr Rodchenko na Pinacoteca do Estado de São Paulo (comigo não é "Pina_" nunca não, falou) em 2011 que jamais esqueci. Porque construtivismo russo basicamente traduz meus sonhos.

Assim como o filme que Orson Welles (que homem) fez em adaptação de O Processo, de Franz Kafka (que homem, que livro, também me lembro o exato momento em que encontrei numa prateleira lá no fundo do Sebo do Messias), com edifícios surpreendentemente grandes em vista da pequenez de Josef K., aquele magrelo ombrudo lindo denominado Anthony Perkins; filme esse que ilustrará meu artigo em sua revista digital.

Orson Welles - The trial, 1962. (Anthony Perkins)
Porque é aquele negócio, como diz Alceu - sempre ele, em tantos momentos simbólicos de minha vida -,
Sinto o frio entrando pelos ossos
Como uma coisa um troço
Não sei explicar

Contudo, estou sabendo explicar de alguma forma, porque existe uma coisa chamada marxismo e outra materialismo histórico, e uma pessoa chamada Pierre Bourdieu, outra chamada Raquel Rolnik e outra Gregori Warchavchik, que por acaso nasceu em Odessa, cidade Ucraniana que tem essa maravilhosa escadaria de Potemkin, a mesma de Eisenstein, com a maior fotografia de todos os tempos:
Aleksandr Rodchenko - The Stairs/Steps, 1929/30.
Quando eu era pequena, era século XX. O meu século, o século que dá aquele esquisito no peito, o fim do segundo milênio. Tudo isso é sobre aquilo. Sempre estou lá. Todas essas coisas são, talvez, o mundo de meu espelho. E eu dei uma paradinha no artigo, que devo terminar até amanhã, para escrever descompromissadamente para ver se agora vai. Pretendo voltar aqui com o trabalho entregue, com o link para leitura, com sossego e com férias.

Me desesperei de modo abissal em 2017, por motivos infinitos: do cuore, de família, de trabalho, de escola técnica, de mim mesma. Me desesperei para escrever, me desesperei escrevendo, me desesperarei com o tempo e com a entrega. Mas é assim que me sinto viva, se não tivesse esse tum-tum-tum-bate-bate meu coração, que zabumba bumba esquisito, batendo dentro do peito, eu nada seria.

Onde eu estava quando Belchior morreu: prelúdio para um tcc

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Dia 28 de abril eu tive um sonho - sim, mais um - estranho, já começa por aí.

Escola Normal Caetano de Campos
Estava andando pela cidade à noite, e passava por um edifício que se assemelhava muito à Escola Normal Caetano de Campos, da Praça da República. Era um pouco mais quadrado, mas amarelo e neoclássico do mesmo jeito. A cidade tinha um ar diferente, e eu estava voltando para casa e morava com alguém, não sei quem. Parei para observar os detalhes da arquitetura, e pelas janelas dava para perceber que era um edifício público e cheio das burocracias, portanto kafkiano (essa parte é bastante simbólica, mas talvez eu não saiba explicar o porquê). De tanto observar os detalhes, as características neoclássicas iam "derretendo" até o edifício, que era visto de perspectiva construtivista, se transformar num grande pedregulho com janelas à noite. Percebia que uma caixa de ar condicionado, ou caixa de luz, se desprendia do seu local habitual e a fiação iria soltar faíscas. Não só senti como esperei, quase torcendo para que pegasse fogo. De algum modo queria dizer, a quem morava comigo, que algo de interessante aconteceu em meu caminho.

O sonho acaba. No dia seguinte fui até a Estação Pinacoteca para uma aula, e depois corri para a Estação da Luz, pois iria para o Tietê me encontrar com a amiga. Fomos para São Thomé das Letras - MG aproveitar o feriado de Dia do Trabalho/Trabalhador. Nisso encontrei por acaso com Caju e Castanha, os abracei e beijei, mas já é outra história.

No caminho, chegando a São Thomé por volta das 19h, 20h, eis que acontece um absurdo. Tem uma pedreira na entrada da cidade. Esta pedreira, da minha vista no ônibus, era exatamente o edifício de meu sonho, na mesma composição diagonal que confere movimento à imagem e destaca a grandiosidade das formas, inclusive. Foi impactante, mas ainda tem mais. Conhecemos a cidade, dancei Comfortably Numb na sacada da pizzaria, morrendo de frio, etc., turistamos e no dia seguinte partimos rumo às cachoeiras. Fomos a pé, pois sou uma pessoa que definitivamente detesta carona.

Descemos e vi a pedreira de dia, linda, meu coração afundado no peito. Fomos nas águas, fizemos amizade com um casal hippie latinoamericano sem dinheiro no banco, compartilhamos certas coisas e enfim. Mais à frente uma família cantava Tropicana, e eu cantei também, porque né: Alceu. Subimos a estrada em direção à cidade novamente.



A internet ali é péssima, funciona de quando em quando. De volta à pedreira, olhando o mundo e a infertilidade das pedras, aquele Sol quente-frio, sinto o celular vibrar. Colega de classe afirma que Belchior morreu, e eu nos pés da pedreira no meio da estrada. Belchior morreu. Não sei se senti a dor ou a beleza do momento, talvez os dois. Belchior sempre me conferiu dor e beleza. Por exemplo, quando pequena eu tinha medo da melodia de Velha roupa colorida. Medo que me dava dor, mas dor e medo porque é minha música favorita dele. De início costumo sentir dor e medo do que é belo, como magnetismo de um imã, que ora rejeita, ora se gruda e quase que não larga mais.

Então senti a dor e a beleza da morte de Belchior aos pés da pedreira de meus sonhos. Foi a morte mais bonita de toda a minha vida.

Um mês depois entreguei um artigo para o curso, coisas aconteceram e minha vida rodopiou como o diabo gosta. Se foi bom ou ruim, não faço ideia; mas ainda mexe muito comigo, é como aquele livro favorito que te frustra e você jamais esquece. Estou dentro dos livros mais doloridos, pesados, profundos, bonitos, maduros, que já li.

Depois desse artigo, teve um segundo, que foi trabalho de conclusão de curso. Entreguei na quarta-feira. A conexão com a história de Belchior é a edificação, além de questões subjetivas que nem sei explicar porque nem pensei direito. É o seguinte: decidi falar da ligação pessoa-edifício, justamente desse imã que ora repele e ora atrai. Porque, veja bem, como é que pode um edifício público não ser frequentado por toda a população de um determinado lugar? A simbologia das estruturas, o conceito arquitetônico, os projetos políticos, a imposição dos intelectuais, tudo influencia na agonia que a gente sente às vezes entrando num edifício. Como o curso é de biblioteconomia, falei de bibliotecas. Citando o Poder Simbólico de Pierre Bourdieu, o Manifesto de Warchavchik, A Cidade de Chico Science. Falta a correção e, se tudo der certo (ou nada der errado), será publicado em breve.

O que aconteceu com esse texto? De olhos abertos, lhe direi: amigo, eu me desesperava. Tive de agosto a novembro para escrever 15 páginas, e as quatro últimas - e essenciais - fiz, como sempre, na madrugada do dia anterior. Porque eu funciono de noite. Então fui dormir às 5h e acordei às 7h35. Ajustei detalhes até as 19h e entreguei às 20h. Cronograma e antecipação não trazem emoção (quase uma frase Jack Torrenciana, hein?).

All work and no play makes Jack a dull boy
Então é isso. Desde que me entendo por gente, sonho com edifícios. Desde que nasci estou relacionada de alguma forma com o construtivismo russo. Com pedra, areia e sol. Com dores que proporcionam prazeres. Com angústias. Com questões sociais e de poder. Com O processo de Franz Kafka, que ilustra meu artigo na obra de Orson Welles, de 1962. Faz todo o sentido do mundo eu trabalhar com patrimônio e memória, com apropriação de espaço e questionamento de poder. O poder invisível, sobretudo. É possível que eu tenha escolhido o rumo nesse próximo quinquênio de minha vida: as questões arquitetônica, artística, estética e social.

Era mais ou menos essa cena: o edifício e eu
Agora estou aqui, com algumas coisas mais ou menos resolvidas, com o curso acabando, problemas de maio para cá se resolvendo, o artigo entregue. Estava ansiosa para 29 de novembro para ter sossego. E agora que risquei todas essas tarefas de minha lista, adivinha o que aconteceu? Tédio. E com o tédio das questões cotidianas resolvidas, eu me lembro de quem? Dele, a mosca, meu irmão:
Eu devia estar contente por ter conseguido tudo o que eu quis
Mas confesso, abestalhado, que eu estou decepcionado
Por que foi tão fácil conseguir e agora eu me pergunto: e daí?
Eu tenho uma porção de coisas grandes pra conquistar
E eu não posso ficar aí parado
Esse ano eu morri, mas ano que vem eu não morro! ✌

Nesta vizinhança sou filha bastarda

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Hieronymus Bosch - O jardim das delícias terrenas, 1504.
2017 foi um ano estranho. Tudo de pior aconteceu com coisas boas acontecendo por dentro. Ou pelas beiradas. Preciso começar dizendo que, muitas vezes em minha vida, principalmente quando se tratava do meu pai, minha mãe e minha irmã costumavam dizer que eu sempre agia diferente dependendo de com quem eu tratava. Pois bem. Nunca achei ruim, me defendi - ou criei uma desculpa para mim mesma - dizendo e pensando que para cada pessoa há um trato. Textos exotéricos - genéricos - dizem que quem tem libra no mapa astral costuma ser muito sociável e diplomático. Quem tem câncer, então, costuma saber manipular. São, respectivamente, minha lua e meu sol. Eu culpo os signos mesmo, para não ter que culpar a mim mesma por não conseguir mudar ou ser como se deve.

2017 começou ruim, porque começou com pendências de 2016. Há pessoas na internet se achando muito sábias ao dizerem aquela tal "novidade" que esperar que o ano acabe é um pensamento idiota e que a vida não muda. Olha, muda sim. Só pelo simples fato de termos calendários milenares, fases da lua, posição dos astros, rotação e translação da terra e mudança de estações. As pendências podem virar a página do calendário conosco, mas é um novo ciclo sim, nosso corpo percebe isso, e sua chuva de likes não muda este fato.

Posto isso, 2017 foi um ano de término de relações, quebra de laços. Começou por minha culpa e terminou por meu senso de justiça. Este meio não é simples de explicar, mas não posso fingir que não aconteceu. No mesmo ano, reconectei-me com pessoas do passado e me empolguei bastante, conheci pessoas novas - ontem mesmo! - e queridas, me senti esquecida, e esqueci também.

Em 2017 apaguei de vez meu twitter. Cansei das pessoas de lá. Cansei mais das bolhas esquerdistas cirandeiras good vibes gratidão sororidade do que dos piores trolls da história da humanidade recente, reavivadores de pragas preconceituosas horrorosas. É como se eu estivesse, nos últimos cinco anos, indo do centro do espectro político, caminhando paulatinamente para a extrema esquerda e pulando no penhasco do plano cartesiano, para o sul de lugar nenhum. Sempre tive problemas com gente, independente ou até mesmo por causa de sua posição política e da quantidade de sua externalização de simpatia, antes mesmo de saber ler. Continuo seguindo comunista, mesmo que comunistas possam vir atestar que não o sou: neste aspecto, só confio em Marx e nada mais.

Dizer especificamente o que estou tentando explicar pode ser um problema: nunca cometo pequenos erros enquanto eu posso causar terremotos. Inclusive, um dos motivos de eu pegar ranço de twitter é justamente a péssima interpretação que as pessoas têm, não importa se elas votam em Bolsonaro ou curtem vídeos do Gregório Duvivier. Se elas são estudantes que querem prestar Fuvest para a famigerada FFLCH ou se são engenheiros civis com pós-doc. Então deixa pra depois.

Apesar da humanidade, me descobri frágil. O robô, o encoleirado que eu adorava apontar, do Dahmer, também era (sou) eu. Fugi tanto de rotinas, padrões, coisas estabelecidas, que quando dei por mim estou vivendo assim mesmo. Inclusive é um spoiler da vida que vou dar aqui: fazer aquilo que se gosta não significa ter sucesso acima daqueles que fazem as coisas por obrigação e sobrevivência. No final das contas vamos todos morrer mesmo, e os sonhos realizados também entediam. Isso está escrito em músicas, livros e séries. E mesmo nos contos de fadas! O fim é o felizes para sempre, imagina ser feliz para todo o sempre, sem poder modificar um instante sequer, sem poder variar um sentimento sequer? Quantas vezes nos perguntamos o que há depois do final feliz? Eu estaria numa pior se a vida fosse resolvida. Que mais absoluto tédio.

André Dahmer - Malvados
Meu sonho, na faculdade, era "subir" todos os degraus da academia. Isso há quatro anos atrás. Fui em simpósios, escrevi artigo, mas sempre incomodada. Porque as pessoas vivem em grupos. E detesto estar em grupos. As pessoas conseguem mestrados como se fossem bromélias e seus orientadores plantas que aceitam bromélias como parasitas. Tudo é por indicação. Você, se não é daquele grupo e não concorda com ele, é porque é do grupo contrário. Que preguiça disso. Que preguiça do modo como palestrantes discursam sobre "o lusco-fusco da revolução russa" na FESPSP às 21h da noite, com aquela voz arrastada, lendo um texto próprio - bem mal escrito - e se achando o máximo da genialidade. Que preguiça de ir comer na lanchonete de uma faculdade da qual não pertenço - nem conseguiria - e sentir um peso em meu cangote como se todos estivessem me olhando como acontece naquelas cenas sufocantes do Roman Polanski e do Orson Welles.
Roman Polanski - Repulsion, 1965
Falando em Polanski, aprecio a vivacidade com que vocês discutem sobre obra versus postura do artista. É uma boa pauta, de verdade. Mas é uma "bandeira" para a vida inteira. Dou boa sorte a vocês nessas questões, me privarei delas. Assim como me privei dos jornais. Dos comentários de portais. Da timeline que bloqueei no facebook. Das assinaturas que cancelei.

Houve momentos na vida que tinha certo receio de afirmar minhas coisas. Porque as pessoas cobram. Tanto cirandeiros como impeachmistas possuem a necessidade de querer censurar algo. Geralmente quando querem censurar algo aí é que esse algo se torna famoso, então cuidado. Sempre procuro conhecer e discutir as coisas, e não proibir nada de ninguém. Mesmo que às vezes me aflore um autoritarismo, um exagero.

Hoje tenho preguiça de afirmar minhas coisas só por afirmar. Se afirmo, é porque simplesmente quero dizer como me foi importante a experiência e que sim, vale a pena. Geralmente é clássico, me dou bem com clássicos como vocês se dão bem com o contemporâneo, e assim segue a diversidade.

Hoje tenho preguiça de algo que eu adorava: artigos. Jornalistas são bons em escrever artigos. Eu estava feliz querendo escrever artigos. Mas aconteceram dois artigos esse ano, um deles emocionante, e eu descobri que nem isso quero mais. O tcc vai virar capítulo de revista digital e eu só queria cancelar isso. Percebi que sigo uma área de atuação até bem definida, e isso foi sem querer, mas as coisas são tão iguais sempre que meu deus do céu. Mas tem lugares e temas tão mais burocráticos que até sou uma privilegiada na posição em que estou. Tenho o luxo de reclamar do que conquistei, mas eu confesso que estou decepcionada.

Meu grande problema com aquela frase de Graciliano, com as músicas que ouço, os filmes que vejo e os livros que leio, é que as coisas que sinto não são deste mundo. Pode parecer, e até talvez seja, discurso de adolescente, mas o que me rodeia parece tão apático, igual, padrão, que não cabe toda a minha expectativa - que não sei não ter, mesmo sabendo que a decepção é culpa minha mesmo.

Não sei como terminar esse texto. Só sei que esse ano descobri novos sons, novos vídeos, novos textos, novas pessoas. Também conheci o que é sentir demais e o sentir de menos. Só sei que esse ano parece que vai durar até o fim da minha vida, mesmo que eu escreva outras datas em meus papéis. As pessoas dizem "pode aparecer coisa melhor" e eu penso "como, melhor? melhor para quem?"; "você vai conhecer mais pessoas e lugares" e eu penso "que gasto de energia é conhecer gente, é sempre a mesma coisa: oi, tudo bem, tudo e você, que bom, legal", e a partir de certo momento a gente se acostuma e aí começa tudo outra vez.

Até parece um texto triste e etc., mas essas coisas passam pela minha cabeça desde pelo menos 1995, então eu não estou na pior. Só não gosto de fugir de tristezas e pensamentos perturbadores que levam à reflexão. Detesto conselhos que não servem para nada como "fica bem", "não fica triste", "não chora". É como você aconselhar a um gripado a não ter febre. E não me sinto bem estando bem demais e não conversando comigo, porque parece vazio e... plástico. Tem dias que merecem reflexão. Feliz ou infelizmente minha retrospectiva de 2017 é mais ou menos essa. De alguma forma mudei, me sinto diferente. Tem gente que nem percebe. O grande problema é que tenho horror a rotinas, ciclos, padrões, várias pessoas seguindo um mesmo caminho. Sei que estou dentro disso e não tem como não estar. Lido com isso externamente numa boa enquanto a cabeça pensa nisso e muito mais.

A parte boa nisso tudo é sempre que alguém, lá num passado não muito ou tão tão distante, já falou sobre isso. Ou pintou, fotografou, filmou, cantou. Fez parecer bonito, ou horrível. Porque de alguma forma é. É uma metamorfose, não é mesmo? Mudança de pele, como as cobras fazem. E que bichos bonitos são as cobras. Então me sinto amiga de quem viveu há mais de 200 anos e, apaixonado por uma mulher casada, escreveu Werther, de quem viveu até quando eu tinha dois anos e soube exatamente explicar coisas que eu mesma sinto e vejo, mesmo que a galerinha cool ache que ele é um "babaca do caralho".

Certa vez comentei sobre profissões com a chefia, e esta concordou: há pessoas que nascem para solucionar problemas, nós nascemos para criá-los. Serve para a minha vida toda. Sou aquela que não fala mal das fórmulas matemáticas (inclusive detesto quem fala, e quando fala), nem está tanto assim a fim de saborear o resultado. Sou a que se diverte montando o problema, quebrando a cabeça, vivendo o caminho. Sou, imodestamente, uma moleca maravilhosa.
Eu sou o moleque maravilhoso
Num certo sentido o mais perigoso
Moleque da rua, moleque do mundo, moleque do espaço 
Raul Seixas - Moleque Maravilhoso, 1974.

A dança proibida

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Artista anônimo de Tarragona, Espanha - Euterpe, séc 2
Eu vou tirar meu pé da estrada e vou entrar também nessa jogada e vamos ver agora quem é que vai güentar:

Desde sábado aconteceram algumas questões que me lembraram de algo que me ferve o peito de ódio e eu preciso escrever aqui,  já que a porcaria do facebook não serve de nada e os intelectuais são arrogantes demais para prestar atenção no que a gente fala, se escondendo atrás de nomes históricos.
Olho os livros
Na minha estante
Que nada dizem
De importante
Servem só prá quem
Não sabe ler

Raul seixas - Eu também vou reclamar
Poderia ser blasé e dizer foda-se, mas meus amigos, minhas amigas, eu odeio gente e minha única faca possível para cortá-las são as palavras.

Existem forrós e forrós. O forró que aprendi com minha família é simples, ritmado e combina com as músicas que ouvimos. Gonzagão, Dominguinhos, Flávio José, Assisão, Amazan, Jackson do Pandeiro, Trio Nordestino e por aí vai. A simplicidade dos passos dessa dança é a simplicidade dos passos de um agricultor cansado que tem um momento de folga e vai tocar sanfona para ter um dinheiro a mais para sustentar a família. Meu avô paterno fazia isso. Na minha cabeça é isso. Os forrós de casamento de sítio são isso, um terreiro varrido debaixo de uma tenda e os casais dançam. Botam para fora tudo aquilo que está engasgado no peito e latejando no cérebro, é hora de comer (muito bem, diga-se de passagem) e curtir.

O forró paulistâno, mêo, é outro. É cheio de giros e quase-giros, uma perna para a frente e outra para trás, muito semelhante ao samba-rock e outras danças de salão. Que se aprende em salão. Para quem dança forró desse jeito é possível que aconteça um estranhamento nesse texto, bem como é possível eu ter conhecido pessoas idiotas que dançam desse jeito, e não as pessoas legais que dançam desse jeito. Agora sim: foda-se.

Algumas pessoas com quem dancei acham que preciso "treinar" um pouco os giros. Que devo fazer cursos. Ou simplesmente dançam por dançar só reproduzindo os mesmos giros e os mesmos para-lá-e-para-cás em qualquer música, não importa se é xaxado, baião, pé-de-serra, coco ou frevo. Não há proximidade, pelo contrário. Eu já dancei com um rapaz que só ia me girando enquanto conversava com o amigo, parado. Outro era tão alto e estava tão bêbado que a coisa não fluiu e me indicou aulas de dança, aquele filho da puta. Eu, em meus exageros passionais, consigo enxergar simbolicamente aquela coisa chamada hierarquia de uns poucos "melhores" e outros muitos "piores", ou mesmo a luta de classes.

Em 2015 andei por alguns forrós em São Paulo e Santo André. Estava empolgada. Até que "que bom que você veio de sapatilha, não danço com mulher de salto alto"; "mulher deve ser conduzida na dança, e não conduzir"; entre outras bobagens e o fato de que o pessoal daquele grupo costuma dançar apenas com o pessoal daquele grupo. Estrangeiros são estrangeiros. É uma apropriação sudestina de dança nordestina que eu não sei explicar porque está no âmbito simbólico da coisa. É no modo de se mexer, de falar, de sorrir, de mostrar simpatia, são máscaras anti-naturais. Perdi o gosto de dançar forró em SP. Até dancei sábado junto a um trio elétrico com nordestinos de verdade tocando suas zabumbas, triângulos e sanfonas do Marabá à Mário de Andrade. Mas dancei mais sozinha do que com as pessoas desses grupos que só giram e dançam artificialmente. Para mim é artificial. Ponto. Mas são estes passos que estão exportando para a Alemanha. Não que os passos sejam ruins: são ou estão vazios de significado.

Eu não imagino meu avô, em 1940, dançando com uma moça daquele jeito. "Minha donzela, você tem que girar assim e assado, veja, quando eu virar aqui você vira ali e etc." Dá pra imaginar? Um agricultor analfabeto da seca da Paraíba mandando uma moça ter aulas de dança? Você aprende dançando. Sentindo. Cochilando nos ombros do seu parceiro de dança, no chiado na chinela, com a poeira levantando e o coração pulsando e as mãos em sua cintura fina e essas coisas.

Pierre Bourdieu (já que os intelectuais adoram referenciar outros intelectuais) fala de arrogância e timidez. É aquele momento, por exemplo, que você acha uma senhora rica metida num espaço e se sente uma pessoa tímida no mesmo espaço porque não sabe se portar. Você chama isso de timidez e arrogância mas é o poder simbólico atuando naquele espaço. É uma pessoa demonstrando poder sobre os demais.

Eu fico fudida com isso.

Essa semana saiu uma música nova da Anitta. Eu fui a última a ver, e adianto que gostei da batida; adoro rebolar. Ouvi opiniões contrárias e a favor, não concordei com nenhuma. Minha postura marxista questiona essa coisa de "visibilidade": eu vejo isso como vender-se ao capital, perigando esvaziar uma luta em troca de fama; mas acho bom ver a sociedade como ela é e questioná-la, sempre: um lado conhecer o outro. Outras pessoas acham isso positivo, porque as famílias que estão alheias a todas essas questões intelectuais percebem essas vivências com as quais possuem preconceitos nas novelas, nos "casos de família" e a coisa vai fluindo. Não sei quem de nós está certo, mas são discussões saudáveis, correto?

Não para quem se põe num pedestal. Para essas pessoas, música pop é um lixo, só o gosto musical delas é bom, e etc. Que música "ruim" imbeciliza pessoas. Será?

Conheço personagens históricos paulistas que possivelmente adoravam Mozart, Guiomar Novaes, Schubert, Bach, Wagner, Liszt, Vivaldi... E financiaram a Ditadura Civil-Militar que golpeou este país em 1964. Conheço livros, dessas mesmas pessoas, que em 1977 ainda chamavam esse movimento de Revolução. Do mesmo modo, conheço verdadeiros pensadores do século XXI, colegas de profissão, militantes de causas grandes e importantes, que leem intelectuais e mais intelectuais que... detestam Beatles e Rolling Stones mas amam Molejo, Raça Negra. Pessoas queridas com bons questionamentos na internet, inclusive amigos próximos, que são fãs de Pabllo Vittar, Anitta, Valesca, Karol Conka, etc. Aprendi com algumas delas e com minha querida irmã a não ser mais uma roqueira idiota que acha pagode e funk um lixo. As canções que embalaram meu curso de biblioteconomia este ano, por exemplo, foram: Qual bumbum mais bate? e Bohemian Rhapsody.

Não estou nem aí se Platão dizia que "cuidado com as músicas que o governo te proporciona". Muito bem, podemos discutir isso. Mas Platão conheceu nossas músicas? O rádio? Os vinis e fones de ouvido? Muitos "super-músicos" eram anti-semitas, racistas, entre outras coisas. Escolas de arte como a Bauhaus foram fechadas por Hitler, do mesmo modo que minha querida URSS cortou as asas do Construtivismo Russo e outras manifestações artísticas que são referência nos manuais de história da arte. Também foram criadas músicas que estavam a favor dos governantes. Músicas "eruditas", conservadoras. Charles Manson e Helter Skelter, etc. Então a coisa não é tão simples assim não, meu irmão.

Houve um movimento na história recente de luta contra música popular versus erudita, que hoje persiste e até o professor Marcos Napolitano vive comentando por aí. Acho ótimo. Tem o Manifesto Antropófago, o livro do Guerra-Peixe, o Movimento Armorial, o manguebeat... Ai, ai, como quero comentar tudo isto aqui!

Gonzagão também deve ter sido comparado com música "vulgar" de um governo "que aliena". Assim como o... SAMBA! Quantas pessoas não foram tidas como malandros imprestáveis, vagabundos e todas essas construções. No governo de Vargas mesmo! Aprendemos isso na Academia, ou não... acadêmicos?

Música, para mim, é a batida do coração. De que adianta a técnica? E aqueles remixes do funk com música clássica, com o hino nacional: não está ali a técnica? Posso estudar a vida inteira que vou poder fazer os solos virtuosos de não-sei-quem, tocar tão rápido quanto o fulano daquela banda. "Nossa, que foda", eles dizem. E eu só penso naquela frase de Clarice: "ou toca, ou não toca". Eles riem de Moonchild e eu penso como é minha música favorita do King Crimson. Eles pensam "ha ha ha, Reginaldo Rossi" e eu rebolo Recife: minha cidade e me lembro dos meus seis anos na casa de Cilene, cansada de sono no colo de mamãe, enquanto os adultos conversavam em roda à luz do luar...

Música é memória, afeto, lembrança, contato. Termino com uma frase que me foi a eureka desse texto e pretendo estudar nos próximos tempos, e com o meu espírito animal dançando no carnaval:

A música é Euterpe, uma das nove musas do templo de Museion, filhas de Mnemosine (memória) e Zeus.

Vadinho, em sua última alegria em vida

С НОВЫМ ГОДОМ!

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Искринская Ирина Павловна (1929 – 1980)


Agradeço quem me acompanhou até aqui! Desejo boas festas e, se vocês não são de festas religiosas, boa e farta bebida e comida neste fim de ano! Que 2018 seja infinitamente melhor que 2017, com a copa na Rússia, as eleições (eita), memes e menes que aparecerão... Enfim. Muitos sentimentos profundos e muita poesia nestas nossas vidas.
Dasvidaniya, tovarishchi!

Chega dançar

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Não gosto desse discurso de positividade porque acredito na força da boa surpresa após momentos de pessimismo - esta é minha maior tática 😉 - mas quero começar meu 2018 diferentemente de 2017, então bora dançar com essa música que me lembra momentos GOSTOSOS do passado recente, meus chapas!

If you say run, I'll run with you / If you say hide, we'll hide / Because my love for you / Would break my heart in two / If you should fall / Into my arms / And tremble like a flower

Aô Davidão bom da moléstia! 🗲
Let's dance! Put on your red shoes and dance [the blues]

* Mas a melhor música dele mesmo é esta aqui.

16. Don't you (forget about me)

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Deixei de responder muitos questionários, tags e memes da internet porque levava a coisa tão a sério que tinha que descobrir, quando perguntada, o que realmente era A coisa favorita DE TODAS sobre aquele tema. Mas existe uma máxima sobre o tempo. Vou escrever no próximo parágrafo só para enfatizar.

A coisa boa do tempo (e ruim também, dependendo do contexto) é que a gente se cansa. Isso serve para muita coisa.

O tempo não só passa. De que adianta o tempo passar e nada mudar, não é mesmo? Não sei, estou pensando agora. Em momentos de desespero, sempre existem aqueles conselheiros ma-ra-vi-lho-sos e súpêr pertinentes (mêo!) que dizem assim: "tudo na vida passa". Olha, mas que legal, obrigada, desligou meu desespero assim, num click, porque tudo na vida passa então meu drama mexicano Soraya Montenegro só aconteceu porque eu não tive a brilhante ideia de pensar que o tempo passa. A pessoa que diz isso não está errada, de forma alguma. É o modo que ela aconselha que me irrita. É sempre um ar de superioridade pseudo-sábia arrogante que me dá nos nervos. Mas não era isso o que eu ia dizer, perco o controle dos pensamentos quando lembro de conselhos. Odeio conselhos. A menos que eu peça e a pessoa tenha um modo humilde de querer me ajudar, e não só pretenda ser humilde ou pretenda querer me ajudar. Se é que dá para entender.

O tempo passa e a gente se cansa. É isso aí. Cansei de muitas coisas em relação a seres humanos. Perdi muito a paciência, que já era escassa, com algumas coisas e simplesmente me cansei de outras, tanto faz como tanto fez.

Então eu cansei de querer ser séria em momentos que, bem, foda-se.

Uma das minhas 𝜋 músicas favoritas de um filme é uma música que acompanhou bem meu 2017 porque ele foi muito pós-punk. Puxa, puxa, que puxa, recontrapuxa, que ano punk foi o ano passado. Eu tive que dançar músicas tristes dos anos 80 indo ao trabalho para poder me aguentar e aguentar os outros.

Então eu estava aqui, no dia em que voltei de viagem, triste à beça, me perguntando o que ainda faço nesta região do Brasil, quando decidi ver um filme naquele serviço de streaming de filmes que pretende ser cool, mas não passa de mais uma empresa capitalista que engana a nós, jovens. Achei um terror espanhol, e como já vi outro terror espanhol bom demais nesse mesmo site, pensei why not? Não recomendo. Então quando acabou esse fui ver minha lista e vi lá aquele filme que-todo-mundo-adora daquele diretor que é realmente-ótimo-pena-que-morreu. Acho que nunca havia visto na tevê.

Nos primeiros cinco minutos eu pensei "meu deus do céu minha música", "nossa o mesmo cenário daquele outro filme" e "nossa é isso que a juventude ama e idolatra? será mais um Pulp Fiction em minha vida?*" e depois "meu deus que meninos bonitos" e "que menina linda e fofa" e "CARL, não posso esquecer desse nome", entre outras coisas.

Mas é isso. Breakfast Club vale a pena demais. Não é noOooOssa, e são várias questões, mas os filmes de jovens dos anos oitenta não decepcionam (como os atuais). Sim, vale a pena enchermos nossos tumblrs com gifs das dancinhas, dos óculos maneiros, dos cheiros que a patricinha dá no cangote do menino rebelde que guarda coisas ilícitas no armário e não tem paciência para a hipocrisia do mundo (o que me lembra ~momentos~), etc.

Ainda bem que o Judd Nelson tinha 26 anos à época do filme e eu total posso ter um crush nesse neném. Benza-te-Deus, meu filho.
E sabe o que vale muito a pena também? O Carl. Que homem.

Na verdade o John Lennon é o menos legal - o nada legal - dos Beatles, é que o gif que eu queria não existe. Mas esse zelador é bonito demais
Mas o desafio não é falar dos adolescentes em detenção odiando (com razão) o mundo adulto e suas injustiças. É falar de:

16. one of your favorite songs from a movie (uma de suas músicas favoritas de um filme)

Não tenho muito o que dizer sobre essa música ou sobre o Simple Minds, que quase nada ouço como banda num geral, apenas posso dizer que esse uuuuuh uuooÔh impacta o mais profundo do meu útero, por assim dizer.


Antes de ir embora eu preciso postar mais um gif porque, assim, mulheres que chegam chegando beijando no cangote merecem destaque, porque ô coisa boa é um cangote meu deus do céu.

"Só vai, garota" (conselho para mim mesma)
Agora vá lá ver um filme de adolescentes bacanapara se divertir um pouquinho neste meio de semana, porque se você mora no sudeste do Brasil, rain keeps falling e ver filmes simpáticos deitada com o cobertor até a cabeça é bom demais.
Don't you try and pretend
It's my beginning
We'll win in the end
I won't harm you
Or touch your defenses
Vanity, insecurity
Don't you forget about me
I'll be alone dancing, you know it, baby

* Pulp Fiction, o famigerado filme que eu detestei (mas estou seriamente pensando em rever para 1: ou mudar meu conceito 2: ou arranjar elementos para provar porque ele é ruim e Kill Bill Vol. 1 é imbatível, se você for pensar nos trabalhos do tal do Quentin Tarantino).

Ah! Leia mais textos do meu 30 day music challenge.

Oh time, do as I wish

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Eu fico me perguntando se, anualmente, a gente passa a repetir coisas que já fez, inconscientemente. Com a ferramenta on this day do facebook é possível, pelo menos pra mim, perceber certos padrões. Por exemplo: ouvir aquela música no dia 15 de novembro de 2017 e ela estar lá postada no mesmo dia em 2013. Já aconteceu com conhecidos: Fulana ligou para Beltrana, que contou no telefone "nossa, Fulana, o facebook me lembrou que nos vimos há exatamente dois anos! E eu estava com a mesma blusa que estou hoje!", e a Fulana recebe a fotografia via whatsapp e percebe que o corte de cabelo "radical" que ela fez há alguns dias é exatamente do tamanho e cor do cabelo dela naquela data anterior. Sim, aconteceu mais ou menos assim.

Hoje aconteceu de eu ter postado, há dois anos, o queridão Seu Jorge cantando Bowie em The life aquatic with Steve Zissou. Acontece que senti nostalgia de assistir esse filme na semana passada. E, aliás, eu postei Let's Dance no aniversário do Bowie simplesmente porque deu vontade, não por saber de seu aniversário - que eu não sabia.

Não é aquela coisa meio 1984 que o dispositivo "escuta" e "lê" o que você diz aos outros perto ou no aparelho e seleciona propagandas que condizem com suas conversas. É algo de uma vontade interior, que parece que funciona como A coisa ou Os olhos famintos, que têm um período específico a cada n anos para aparecer. Talvez seja pela questão cíclica da vida, e eu volto a salientar que sim, uma virada de ano faz diferença e calendários não são algo apenas imposto para a nossa sociedade como objeto de poder através dos séculos, mas algo também sentido física e psicologicamente, se pensarmos na rotação e translação da terra, as quatro estações, os feriados, o tanto de tempo que estamos trabalhando sem folga, etc. Mesmo se estivéssemos fora de qualquer sistema socio-político urbanizado e sedentarizado, ainda sentiríamos as fases da lua e os tempos de plantio e colheita, enfim.

Antonio Lucio Vivaldi -  Le Quattro Stagioni (The Four Seasons) Violin Solo, Federico Agostini, I Musici, 1988.¹
O tempo do calendário é totalmente social, mas submetido aos ritmos do universo.
Jacques Le Goff, p. 420*
Este é apenas um texto despretensioso sobre o tempo, e que vou aproveitar para indicar coisas. Estou me coçando para entrar em questões históricas e de déjà vu, mas aí eu precisaria (preciso!) juntar textos e informações e, quem sabe, montar um artigozinho independente (me prometo isso desde 2013; por favor, 2018, me ajude a concretizar esse quase-sonho!)

Livros
Filmes
Música

Mais duas citações abaixo, com grifo meu.
Seria absolutamente falso e parcial limitar as relações do calendário com o Sol e a Lua a estes cálculos e reformas, apesar da grande complexidade dos fatores que entram em jogo. Se estes "luminares dos céus" presidiram à criação e à ação dos calendários, é porque inspiravam à humanidade sentimentos que iam muito além de uma simples observação científica e utilitária. 
Jacques Le Goff, p. 434*
[...]o ano é sobretudo um ciclo completo de morte e de renascimento: se existem festas ligadas ao fim do ano, o grande problema, visto o simbolismo que encerra, é o da data do Ano Novo. Esta data está geralmente ligada ao ciclo vegetal e lunar.
Jacques Le Goff, p. 437*
E agora, é como diz a música: o tempo passou, a música acabou, eu pensei que tinha algo mais a dizer.

¹ Esta interpretação de As quatro estações é clássica justamente porque é maravilhosa.
² "Had Seu Jorge not recorded my songs in Portuguese, I would never have heard this new level of beauty which he has imbued them with.” - David Bowie
* Paginação referente ao conteúdo digitalizado. A versão em papel possui outra numeração.

Chove chuva, na terra da garoa

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Texto escrito em 27 set. 2014 - quase quatro anos (!) nos rascunhos. Achei que era a caminho do curso Técnico em Museologia, mas era um sábado, portanto passeio.*


Depois de não sei quanto tempo está chovendo em São Paulo. Quem diria que a cidade conhecida como terra da garoa um dia viveria escassez. E viveria num momento conturbado: eleições. E que provavelmente reelegerá o principal culpado pela seca na Cantareira - dica: não é São Pedro.
 
Pelas gotas e vapor que embaçam a janela do ônibus (sim, estou em um) vejo luzes de carros, postes e estabelecimentos que, desse ângulo e a essa hora do anoitecer me remetem tempos que não vivi. Tempo em que de fato garoava (16'40") e que, por causa das diversas homenagens videográficas espalhadas pelo Brasil, eu imagino sempre com um Adoniran Barbosa cantando ao fundo.

 
Uma são Paulo que, ainda que conservadora, dói menos de imaginar, dá até pra perdoar, porque era jovem. Mas o tempo passa e o conservadorismo só piora¹ e fica gagá com suas teorias da conspiração que são mais fáceis de acreditar do que a realidade. Ou outra realidade que não essa. 

Uma São Paulo Antiga, com tantos mistérios e acontecimentos cotidianos anônimos, boas notícias escondidas dos grandes jornais e expostas nas páginas mais corajosas.

Eu gosto de ver as padarias de esquina, o pessoal do meu bairro, sejam adolescentes do passinho, senhoras da Igreja, senhores do forró adaptado longe da origem, num barzinho simpático com karaokê. Cães que olham para os lados antes de atravessar, gatos nos muros das casas, galinhas dangola idem, beliscando fios de alta tensão. Aqui tem um mundo e mil histórias - menos água. Espero que chova mais, para clarear as ideias e saciar sedes.

Desenhei um porco na janela. 21 ago. 2017.

* Links e material audiovisual acrescentados em 18 jan. 2018.
¹ Por acaso havia um texto na mesma data do rascunho falando justamente do paulistano conservador.

Wes Anderson's The life aquatic with Steve Zissou (2004)

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Muitas vezes o coração / Não consegue compreender / O que a mente não faz questão / Nem tem forças pra obedecer


Quantos sonhos já destruí / E deixei escapar das mãos / Se o futuro assim permitir / Não pretendo viver em vão

Meu xará Chris compreende minha ligação com este filme
Meu amor não estamos sós / Tem um mundo a esperar por nós / No infinito do céu azul / Pode ter vida em Marte


Então, vem cá me dá a sua língua / Então vem, eu quero abraçar você / Seu poder vem do sol / Minha medida


Meu bem, vamos viver a vida / Então vem, senão eu vou perder quem sou / Vou querer me mudar para uma life on mars



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